Minas de Ingadanais
Vila Velha de Ródão
Linha Ferroviária e as Minas – Um caminho do Cobre.
Dedicado ao meu pai, ao meu avô e ao meu sogro que trabalharam nestas minas no principio da década de cinquenta do século passado.
Junho de 1975. De repente estou com a minha família e algumas caixas à porta da casa do meu avô em Vila Velha de Rodão em Portugal. Fomos uma entre milhares de pessoas deslocadas e empurradas de uma guerra desencadeada pela descolonização em Angola. No início em Portugal foram dias difíceis no refazer de uma nova realidade. Confortava-me por vezes em tocar nalguns minerais que trouxe de Angola. O meu avô "Matias" percebendo o carinho que tinha pelas pedras, um dia com um sorriso, deu-me um exemplar de calcopirite. Perguntei-lhe "Avô, de onde vem a pedra?" E ele respondeu "toma a linha do comboio até à ponte do ribeiro de S. Pedro e facilmente encontras as minas". Lá fui eu........ e apanhei a febre do minério !
Introdução
A mineralização de cobre das minas de Ingadanais corresponde à principal ocorrência de cobre em Portugal localizada a norte do Rio Tejo e está integrada no território do Geoparque Naturtejo, reconhecido desde 2006 pela integração na Rede Europeia e Global de Geoparques, sob os auspícios da UNESCO. Tem uma história com mais de 3000 anos de atividade mineira que ao longo do tempo foi alterando e transformando a paisagem. Reúne os concelhos de Castelo Branco, Idanha-a-Nova, Nisa, Oleiros, Proença-a-Nova e Vila Velha de Ródão, com 4617 km2 de território, afastados do litoral e do buliço demográfico dos principais centros urbanos, numa paisagem geológica com mais de 600 milhões de anos.
Localização
No distrito de Castelo Branco, a norte de Vila Velha
de Ródão e junto à linha ferroviária, localizam-se vestígios de algumas minas
abandonadas as quais exploravam o cobre e que localmente toda a área destas minas é denominada por Ruínas das Minas de Ingadanais.
As minas nº 1, nº 2 e nº 3 localizam-se em talude ao longo da linha ferroviária.
1- Mina do Ribeiro do Enxarrique está localizada ao Km 65,9 da linha ferroviária.
2- Mina do Ribeiro de S. Pedro nº 3 está localizada ao Km 66,2 da mesma linha e pouco antes da ponte ferroviária.
3- Mina do Ribeiro de S. Pedro nº 2 está localizada ao Km 67 depois da ponte ferroviária e por baixo desta, junto ao ribeiro de S. Pedro na encosta norte.
4- Mina Vila Velha de Ródão nº 2 localiza-se numa área de concessão a NW da mina nº 2.
5- Mina de S. Pedro o Cabeiro está localizada mais a NW da mina nº 4 e junto do ribeiro de S. Pedro o Cabeiro.
6- Mina Sitio do Cobre está localizada ao Km 68, fora da linha ferroviária e junto da barragem da Ribeira do Açafal.
7- Escorial de fundição do cobre está localizado ligeiramente a sul da mina Sitio do Cobre.
8- Mina Vila Velha de Ródão está localizada perto da povoação de Tostão.
9- Mina Peladas do Cobre e fora do conjunto das minas dos Ingadanais está localizada a alguns quilómetros a NW da povoação de Tojeirinha.
Geologia
As estruturas mineralizadas encontram-se embebidas em xistos micáceos, com alternância de grauvaques pertencentes ao Grupo do Complexo Xisto-Grauvaque das Beiras, instalado no Ordoviciano. Estas mineralizações correspondem a estruturas epigenéticas filonianas instaladas em segmentos da falha do Ponsul; um desligamento tardio e variscano de geometria complexa, reativado durante a orogenia alpina, (DIAS & CABRAL, 1989). O depósito ocorre numa rede de veios sub-paralelos N60º-70ºE, inclinando-se 80º para NW. A largura dos veios de quartzo mineralizado com pirite, cobre nativo, calcopirite, calcocite, azurite, malaquite e cuprite varia entre 0,5 e 1,4 m, atingindo o comprimento de 3 km. Em troços do caminho que liga as concessões evidencia-se uma alteração supergénica do veio mineralizado, nomeadamente na zona das brechas tectónicas associadas à falha do Ponsul. Aqui há sobreposições claras de rochas pelíticas do Grupo das Beiras, com cerca de 600 milhões de anos, sobre formações de rochas do Cabeço do Infante, com 50 a 30 milhões de anos.
História
As Minas de Ingadanais e a sua mineralização foram estudadas por Guimarães dos Santos (1945) para a "Empresa Portuguesa de Estanhos, Lda". Os primeiros registos de concessões com explorações datam de 1904 para as minas de S. Pedro-o-Cabeiro e Sítio do Cobre, que pertenciam à empresa mineira francesa "Société Minière Ibérique", com sede em Bruxelas e filial em Vila Velha de Ródão e que foram declaradas abandonadas em 1916 e 1921, respetivamente. As demais concessões pertenciam à empresa francesa "Société Anonyme des Mines de Cuivre de Rodan", com sede em Gavião de Rodão até 1921. Esta empresa registou em 1911 as concessões para a mina de Vila Velha de Rodão e Vila Velha de Rodão nº 2. Todas as concessões foram posteriormente atribuídas à "Empresa Portuguesa de Estanhos, Lda.". As operações mineiras cessaram em 1968 para a mina S. Pedro-o-Cabeiro e mina Sítio do Cobre. Finalmente em 1986 foram cessadas as explorações da mina do Ribeiro do Enxarrique e das minas do Ribeiro de S. Pedro nº 2 e nº 3.
Trabalhos Mineiros
1 - Mina Ribeiro do Enxarrique
Trabalhos mineiros com alguma desenvoltura foram executados na mina do Ribeiro do Enxarrique. Esta mina tem vestígios de dois poços, sendo que o poço nº 1 terá atingido 143 m de profundidade, o qual presentemente está entulhado. Perto do poço nº1 existe uma escombreira com estratificação bem marcada, onde se encontram restos de carvão vegetal e escórias. Neste local apresenta também um desmonte a céu aberto com planos em degraus, assim como vestígios dos alicerces de edifício, onde preparavam a concentração do minério, o que se evidencia pela abertura de piscina escavada em xisto, desenvolvida em três níveis distintos. Aqui o produto processado na altura era de 15 a 18% de Cobre. O Poço nº 2 situa-se mais a norte, junto da linha férrea, o qual só se vislumbra uma escombreira quase coberta por vegetação.
2 – Mina do Ribeiro de S. Pedro nº 3
Na mina do Ribeiro de S. Pedro nº 3 existem duas zonas que correspondem a veios sub-verticais bastante alterados. Apresenta vestígios de alicerces e escombreira junto da linha ferroviária. A escombreira foi parcialmente removida ao longo da linha ferroviária para a abertura de caminho.
3 – Mina do Ribeiro de S. Pedro nº 2
Na mina do Ribeiro de S. Pedro nº 2 a exploração do minério era feita através de um poço e do qual não há qualquer indício, restando vestígios de escombreira parcialmente coberta por vegetação.
6 – Mina Sitio do Cobre
Na mina do Sítio do Cobre encontram-se dois poços com galerias/trincheiras alinhadas a NE-SW. O poço nº 1 encontra-se a 140 m de cota e o poço nº 2 a 160 m de cota. É possível observar nesta exploração, minerais secundários de cobre resultantes do escoamento superficial. No poço nº 2 existe um veio de quartzo sob o qual segue a galeria. Do mesmo lado existe uma escombreira de cor amarelada como resultado do desmantelamento do nível de oxidação (chapéu de ferro) que se estende até ao caminho que passa ao fundo da escombreira.
Mineralogia
As mineralizações primárias destes depósitos são catalisadas através do silício nos veios de quartzo. São mineralizações geralmente constituídas por cobre nativo, ferro, enxofre, arsénio e em menor quantidade, prata, zinco e chumbo. A base do minério das Minas de Ingadanais consiste em calcopirite, pirite, marcassite, arsenopirite, covelite e vestígios de tenantite, galena e pirrotite. A mineralização secundária resultante da oxidação do minério é muito bem visualizada no (chapéu de ferro) da mina Sítio do Cobre, onde apresenta alterações em outros sulfuretos, óxidos, hidróxidos e sulfatos de cobre e ferro. Menos comuns são os arseniatos e fosfatos de cobre. O cobre do (chapéu de ferro) é desalojado pela água da chuva, o qual posteriormente é alojado na zona de cementação da mina em carbonatos de cobre. Os minerais secundários mais importantes são: Cobre nativo, calcocite, cuprite, goethite, malaquite, azurite, antlerite, etc. Nesta mina Sitio do Cobre identificam-se visualmente alguns arseniatos e fosfatos de cobre como a clinoclase, olivenite e libethenite. Requer um estudo de mineralogia mais detalhado, pois provavelmente possui outras representações de sulfatos, arseniatos e fosfatos de ferro ou cobre com outros elementos. Normalmente os fluidos mineralizados arrastam outros elementos como K, Al, Ca, Cl etc. que se encaixam bem nas redes cristalinas.
7-Trabalhos de Fundição
Perto da mina Sítio do Cobre e junto a uma ponte
romana da ribeira do Açafal, existe um depósito de escórias resultante da fundição
de minério de cobre. Estes trabalhos de fundição são anteriores ao registo da
concessão em 1904. As escórias das Minas de Ingadanais foram estudadas e
analisadas por João Carvalho e Miguel Gaspar (2009), que identificaram outro
depósito de escória na mina do Ribeiro do Enxarrique com trabalhos de fundição
da década de cinquenta. Constatou-se que as escórias da antiga fundição da mina
Sítio do Cobre são mais densas, menos vacuolares, mais desvitrificadas e muito
mais ricas em cobre quando comparadas com as escórias dos anos cinquenta,
sugerindo uma redução menos eficiente e que dataram esta fundição antiga ao
período da ocupação Romana na Lusitânia. As escórias romanas apresentam uma
cobertura de cor esverdeada devido à oxidação do cobre, são vacuolares com
aderências de xisto e carvão vegetal. Algumas vezes exibem inclusões de
glóbulos metálicos devido à redução menos eficiente. Estes glóbulos metálicos
foram identificados como cobre nativo e cuprite. Os glóbulos de cobre nativo,
geralmente ladeados por cuprite, são comuns e frequentemente modificados/decompostos
para outras fases metálicas ainda não identificadas. Minerais como cuprite,
cobre nativo, covelite, bornite, pirrotite e/ou cubanite (?), pentlandite (?),
sulfatos de cobre, hematite e goethite tendem a preencher parcial ou totalmente
os espaços vacuolares resultantes dos gases de exaustão.
Mineralogia das Escórias Romanas
Os sulfatos de cobre normalmente alojam-se nos espaços vacuolares ao longo da periferia externa da escória. Foi identificado visualmente a brochantite, connellite, antlerite (?). A brochantite apresenta-se em cristais prismáticos frequentemente com cores alteradas para verde-claro, amarelo, marrom e branco, indicando pseudomorfoses ou séries por identificar. A chalcofilite de início foi identificada visualmente por causa da estrutura cristalina hexagonal. Uma análise efectuada posteriormente a este mineral na Áustria pelo Dr. Uwe Kolitsch indicou Desconhecido - (Cu-S-Si-O-OH) com semelhança a ocorrências em escórias nas localidades de Lechnerberg na Áustria e mina Les Rats na França.
Estas escórias romanas acima citadas também requerem um estudo mais detalhado de mineralogia, tornando a mina Sítio do Cobre um local interessante no estudo de minerais. Uma breve nota sobre as escórias da mina Ribeiro do Enxarrique, resultantes da mineração dos anos cinquenta, indicam baixa densidade, mais vacuolares e vitrificadas. Apresentam um revestimento de oxidação ferrosa, relíquias de rocha vitrificada, carvão vegetal e raramente minerais secundários de cobre.
Martins
da Pedra
Referências:
Ingadanais Mines, Vila Velha de Ródão, Castelo Branco, Portugal (mindat.org).
ACAFA nº13 - Património geomineiro a este da Serra das Talhadas (Vila Velha de Ródão): Minerais Excecionais das antigas Minas dos Ingadanais e Sitio do Cobre.